O Dólmen 2 de Chão Redondo, localizado em Sever do Vouga, Aveiro, emerge como um testemunho notável do megalitismo peninsular, destacando-se não apenas pela sua imponência arquitetónica clássica, mas sobretudo pela singularidade e riqueza das suas gravuras rupestres.
Integrado numa necrópole megalítica mais vasta, este monumento de corredor, classificado como Imóvel de Interesse Público desde 1998, representa um elemento patrimonial de invulgar interesse nacional. Muito próximo encontra-se outra anta um do Chão Redondo.
O Portugal Notável adora antas e já visitamos umas boas dezenas de antas, algumas delas notáveis, ficamos sempre fascinados a assistir, quase ao vivo a uma das maiores revoluções da história da Humanidade que ocorreu no Neolítico com a sedentarização e a criação da agricultura. No concelho de Sever do Vouga, ergue-se, o enigmático, o Dólmen 2 de Chão Redondo. Não é apenas uma estrutura de pedra, mas um testemunho palpável da “revolução” neolítica, da crença na eternidade depois da morte, com a deposição dos defuntos na câmara e da relação profunda do homem com os astros, em especial o Sol. Qualquer anta materializa atos ritualizados que nos estão velados. Esta região tem antas notáveis, como a famosa anta de Antelas (***), a anta da Capela dos Mouros (*), a anta da Cerqueira (*) e pertinho do Dólmen 2 do Chão Redondo, encontra-se o dólmen 1 onde foi recolhido machados em Anfibolito e lâminas de Sílex.
Não é apenas uma estrutura de pedra, mas um testemunho palpável da “revolução” neolítica, da crença na eternidade depois da morte, com a deposição dos defuntos na câmara e da relação profunda do homem com os astros, em especial o Sol. Qualquer anta materializa atos ritualizados que nos estão vedados.
A sua breve, fase de ocupação, entre o final do V milénio a.C. e a primeira metade do milénio seguinte, revela um planeamento construtivo de notável precisão. A simetria e o equilíbrio na disposição dos monólitos da câmara e do corredor são um espelho da inteligência e do propósito das comunidades que o edificaram. As escavações desvendaram um complexo entramado de camadas e estruturas:
-a câmara poligonal de sete esteios,
-o corredor mais baixo que impunha a reverência do visitante,
-um robusto contraforte a sustentar a mamoa,
-e os espaços rituais externos, como o corredor intratumular e o átrio. Estes não eram meros elementos funcionais, mas portas para um conhecimento restrito, onde o ato de curvar-se ao entrar se integrava num “circuito ritual preciso”. O encerramento do dólmen, com a deposição caótica de pedras e oferendas, selava o túmulo e a memória de um tempo de profundo impacto na coletividade.

As gravuras rupestres do Dólmen 2 do Chão Redondo
Mas é na “voz da pedra” que o Dólmen 2 de Chão Redondo revela a sua alma. As gravuras rupestres, notavelmente executadas antes mesmo da colocação dos esteios, são o ponto alto deste monumento. O Esteio de Cabeceira é o centro desta narrativa figurativa, dominado por um imenso arboriforme, interpretado por alguns como a representação de um indivíduo, ou seja, uma figura tutelar, mas fica a dúvida.
Esta iconografia, com os seus “V’s” abertos e invertidos, ziguezagues e a técnica de picotagem, observando-se os negativos de contorno arredondado, encontra paralelos na arte esquemática pintada, nomeadamente nos arboriformes simples. Outros esteios também se vestem de símbolos: o Esteio à Direita da Cabeceira com os seus ziguezagues e círculos, e o Esteio no Corredor com o seu meandro e figura subovóide, que ecoa a arte gravada ao ar livre, como a da Pedra do Lobo.

Gosto de imaginar que este ziguezaguear correspondia a linhas de água ou a montanhas do Maciço da Gralheira, mas a única certeza é que nunca teremos a certeza do que queriam comunicar estes artistas simbólicos.
Toda a composição foi conseguida pela técnica de picotagem, observando-se os negativos de contorno arredondado.
Em suma, o Dólmen 2 de Chão Redondo na sua singularidade transcende a mera função sepulcral. É um “depósito de conhecimento”, onde a arquitetura e a arte se entrelaçam para tecer uma complexa cosmogonia. Os espaços segmentados e os constrangimentos físicos impostos ao visitante não são acidentais, mas parte de uma “experiência de perceção condicionada”, que visava guiar os indivíduos para uma compreensão mais profunda do mundo. Este monumento é a súmula é um objeto de estudo singular que nos permite espreitar as sociedades pré-históricas e a sua incessante busca pela transcendência.
Notas adicionais:
1-As magníficas fotografias foram retiradas deste site da rota do Megalitismo.
2- Santos, Filipe J. C. etc – O Dólmen 2 de Chão Redondo (Sever do Vouga, Aveiro)… Portvgalia, Nova Série, vol. 31-32, Porto, DCTP-FLUP, 2010-2011, pp. 5-41