Panorama e vestígios arqueológicos da Ermida da Nossa Senhora do Castelo (Aljustrel) (*)

Panorama e vestígios arqueológicos da Ermida da Nossa Senhora do Castelo (Aljustrel) (*)

Resumo

A Ermida da Nossa Senhora do Castelo em Aljustrel, classificada como Imóvel de Interesse Público desde 1992, oferece um panorama rico em história e beleza natural. Do topo da colina, a vista abrange vestígios arqueológicos que remontam à Idade do Cobre, revelando a longa e rica história da mineração na região.

A Beleza do Alentejo na Ermida da Senhora do Castelo

A vila de Aljustrel está rodeada por colinas associadas a erosão diferencial, é o caso da Ermida da Nossa Senhora do Castelo, cerro da Mangacha, Cerro de Santo Adrião ou o cerro da Malpique (*) entre outras.

Afloram aqui rochas pouco comuns em Portugal como Jaspes, chertes e outras com nomes incomuns, e ainda mineralizações associadas a chapéus de ferro marcam a geodiversidade de Aljustrel.

Aljustrel é uma das principais minas da Faixa Piritosa Ibérica, com as massas de sulfuretos polimetálicos com cobre, zinco, ferro, manganês, ouro, prata…

Esta exploração possibilitou a existência de povos como os fabulosos Tartéssios ou a implantação romana do vicus metallum vispascensis, ou seja, a Vipasca romana e que se estendia de um a outro lado do Morro de Algares.

A colina da ermida da nossa Senhora do Castelo, está situada a 247 metros de altura, que é mais uma destas colinas e de onde se avista uma paisagem encantadora para a laboriosa vila mineira de Aljustrel, talvez a mina mais antiga do mundo em atividade, porque provem precisamente do início da mineralização (Calcolítico) apesar de ter tido períodos de menor e maior atividade.

No topo de um pequeno cerro a Ermida da Senhora do Castelo em Aljustrel é um lugar de serenidade e encantamento. Este santuário branco, simples e imponente, oferece uma janela privilegiada para entender a alma dos mineiros alentejanos e da grande revolução da idade dos metais.

Estas estranhas pedras desgastadas pelo tempo narram histórias das civilizações da Idade dos Metais, romanos, muçulmanos e cristãos da idade média, civilizações que exploram estas terras e deixou marcas indeléveis na cultura local.

O olhar estende-se para além das colinas suaves, alcançando a pitoresca vila da Messejana, marcada pela longa falha com o mesmo nome. Mais ao longe, a bonita cidade de Beja surge no horizonte, um marco de história e cultura, coroada pela sua icónica torre de menagem.

A vista amplia-se ainda mais para as vastas planícies do Sado, serenas e tranquilas, onde o céu parece abraçar a terra. Ao longe, a peneplanície alentejana, pontuada por pequenos cerros, desenha uma paisagem onde a quietude reina e o tempo parece correr mais devagar.

Por baixo desta beleza serena, repousa o mistério da mineração, que remonta à Idade do Cobre. O Centro Mineiro de Aljustrel é um lugar de história profunda, onde homens e mulheres escavaram as entranhas da terra em busca de metais preciosos. As minas, ainda hoje em intensa laboração, são ecos de um esforço sobre humano que atravessou os séculos, desde os primórdios da metalurgia até aos dias modernos.

Estar na Ermida da Senhora do Castelo é sentir o peso da história metalúrgico nas colinas e onde a beleza cativa.

O relevo de Aljustrel encontra-se condicionado pela Falha da Messejana com orientação NE-SW e com desligamento esquerdo com 2,5 km de deslocamento (rejeito).

Esta é uma das principais falhas de Portugal, que une Plasencia ao mar ao largo de Odemira.

Olhemos para NW da falha encontramos o bloco abatido da bacia Terciária do Sado, o relevo é aplanado e suave.

Esta evolução reflete-se no setor sul, onde se encontra Aljustrel, com levantamento gradual do bloco imprimindo um encaixe erosivo mais profundo das linhas de água.

A colina onde se situa a Capela de Nossa Senhora do Castelo reflete este fenómeno dado aqui existir um alinhamento de jaspes, rochas siliciosas formadas no fundo do mar, muito coesas e de difícil erosão. Em outros cerros como Moinho, Malpique e Mangancha são conhecidos também jaspes, localmente com óxidos de ferro e de manganês, que foram explorados durante o último quartel do séc. XIX e princípios do séc. XX.

No cerro que se encontra ligeiramente para NW situava-se o Castro da Mangancha, uma povoação fortificada da Idade do Bronze que se prolongou pela Idade do Ferro até à chegada dos Romanos, altura em que foi abandonada. À implantação destes locais não deverá ser alheia a sua posição altaneira com evidentes benefícios defensivos e a sua proximidade ao chapéu de ferro de S. João do Deserto.

Fases de Ocupação da Colina da ermida de Santa Maria do Castelo: Da Idade do Cobre à Ordem de Santiago

As escavações efetuadas no morro revelaram três fases distintas de ocupação:

Idade do Cobre (Calcolítico)

Numa bolsa não violada de material da Idade do Cobre encontrou-se abundantes ossos de fauna e um fragmento de cadinho de fundição de cobre (que se encontra no museu). Estes primeiros colonizadores do Morro do Castelo, instalaram-se aqui devido à existência junto dos afloramentos, de massas de sulfuretos polimetálicos.

Na colina da Ermida da Nossa Senhora do castelo, não se encontram registos romanos, porque em tempo de Pax Romana, estariam ocupados a desbravar a mina de Algares.

Esclarecimento da fase emiral-califal: Apesar das fontes documentais mencionarem Aljustrel no século X, não foram encontrados materiais arqueológicos que confirmem a ocupação anterior ao período Almóada. Escavações mais profundas são necessárias para esclarecer este período.

No tempo muçulmano a população vai-se estabelecer aqui cerro de vertentes pronunciadas e com um amplo controlo visual, o Morro de Nossa Senhora do Castelo, cuja amplitude visual abarca desde a área de Beja até Messejana, dois sítios fortificados com quem podia comunicar.

O povoado vem referido nas fontes árabes desde inícios do séc. X, no período de conflitos dos levantamentos muladíes contra o centralismo e a política fiscal da dinastia Omeida ocorridos no Sudoeste do al-Andalus.

Identificou-se aqui neste cerro o Aljustrel com o castelo de al-Baštrīl, mas, no entanto, não se encontrou nenhum registo do período que o comprove.

Período Almóada (séc. XII – XIII):  A segunda fase, e a mais proeminente em termos de estruturas e materiais, corresponde ao período Almóada. As escavações revelaram uma fortaleza com muralha de taipa, ruas, e unidades habitacionais que se adaptam à topografia do terreno. A análise cerâmica confirma a cronologia Almóada, com paralelos em Mértola e outras cidades do sudoeste peninsular.

Dentro do período Almóada, os autores identificam duas fases. A primeira caracteriza-se por um urbanismo planificado, com ruas e edifícios bem definidos. A segunda fase foca-se no reforço da muralha, com a destruição de algumas habitações para melhorar as condições defensivas. Esta fase sugere preparativos para resistir à conquista cristã.

A localização de Aljustrel, no cruzamento de rotas entre o Sado e o Guadiana, conferiu-lhe grande importância estratégica. Apesar da sua pequena dimensão, o castelo controlava um vasto território, servindo como centro administrativo e militar.

A plataforma superior do morro do Castelo, sugere que a atual Ermida de Nossa Senhora do Castelo tenha sido construída sobre o espaço religioso da época islâmica. Considerando as vertentes abruptas que circundam o morro, considera-se que o cemitério islâmico se situaria na plataforma onde hoje se encontra a Igreja Matriz (Macias 2005).

Ordem de Santiago (séc. XIII – XVI):

A terceira fase corresponde à ocupação cristã após a conquista do castelo por Paio Peres Correia, Mestre da Ordem de Santiago, em 1234 e marca um ponto de viragem na reconquista, abrindo caminho para a conquista do Algarve.

A Ordem realizou modificações significativas na fortaleza, incluindo a construção de uma Torre de Menagem e a reparação da muralha Almóada. O restante casario parece ter sido abandonado, com o castelo servindo como residência da guarnição militar e da administração da Comenda.

A conquista ocorre num período de grave crise do Império Almoada, em que os núcleos urbanos e os campos se encontravam indefeso.

As conquistas levadas a cabo pelo Mestre Espatário irão convertê-lo no herói do avanço cristão. As suas façanhas têm início em 1228 a partir do Castelo de Palmela, sede da Ordem Militar de Santiago em Portugal desde 1217. Nomeado Comendador de Portugal, inicia em 1232 campanhas de assédio ao longo da Ribeira do Roxo que culminam em 1234 com a conquista de Aljustrel, cujos territórios são doados à Ordem em 1235 por D. Sancho II. Nesse mesmo ano toma Sesimbra. Aljustrel que se converte no centro de operações da Ordem, funcionando como ariete das conquistas que irão ter lugar para sul. É a partir daqui que se realizam as ações de castigo e pilhagem em território muçulmano, como as que ocorreram em Estômbar e Alvor, bem como a conquista de Odemira. Mértola é conquistada em 1238, atravessa o Guadiana para conquistar outras povoações como Puebla de Guzmán que cae em 1239. Sem perder tempo, Paio Peres Correia dirige-se para Ayamonte em cujo cerco o Mestre esteve acompanhado pelo rei Sancho II. Em 1240 ocupa Ayamonte e Cacela. A campanha terminou com a conquista de Tavira, embora não haja certeza da data, apenas que pertencia à Ordem em 1244, quando Paio Peres Correia era já o Comendador Geral da Ordem de Santiago, após ter sido nomeado em Mérida em 1242.

Concluída a conquista do Algarve no reinado de Afonso III, o Castelo de Aljustrel perdeu todo o seu valor estratégico e militar. Aljustrel converteu-se então numa Comenda Menor da Ordem. A documentação da Ordem de Santiago descreve que no início do séc. XVI o Castelo se encontrava derrubado e sem portas. O que ainda existia terá colapsado com o terramoto de 1522, já que a visita de 1525 refere que a Ermida se encontrava arruinada (Livro de Visitação às Igrejas da Ordem de Santiago).

A Ermida da Senhora do Castelo

A construção da capela inicial é atribuída a D. Paio Peres Correia, no entanto, não há certezas da sua origem, para além da existência do dito castelo.

Este Santuário e é composto por um escadório que parte da Rua de Nossa Senhora do Castelo até ao Adro da Ermida, onde se encontra uma arcada com um campanário com um sino que outrora chamava a população para o culto e alarmava para os incêndios. A Ermida é de uma só nave, em que as paredes interiores se encontram revestidas de azulejos tipo tapeçaria do séc. XVII. A escadaria foi construída nos anos 40 do Seculo XX e nos finais dos anos 80 a abertura de valas para eletrificação da zona envolvente, pôs a descoberto materiais de origem medieval, nomeadamente cerâmicas e ossos de animais.
Narra a lenda associada à Ermida, que o construtor pretendia deixar de fora uma rocha sob a qual a Virgem Maria tinha aparecido após a conquista cristã, mas sempre que os pedreiros deixavam o trabalho, à noite, as paredes ruíam misteriosamente, até que então resolveram edificar a Ermida sobre a rocha, nunca mais tendo ruído. Diz ainda a lenda, que ao encostarmos o ouvido nesta rocha ouve-se o mar ao fundo e se algum dia esta for arrancada o mar entrará por ali e inundará a vila. 

A devoção a Nossa Senhora do Castelo está enraizada nas gentes deste concelho, e teve o seu pico maior na nossa era, nos tempos da Guerra do Ultramar. Fato que comprova esta devoção, são os inúmeros ex-votos em forma de fotografias, joias e outras peças de ourivesaria, figuras de cera, de fitas de cetim, flores. Anualmente, celebram-se as Festividades em Honra de Nossa Senhora do Castelo, constando no programa momentos musicais e muitos outros divertimos, com os arraiais típicos e na parte religiosa, as pregações, Eucaristia e a Procissão que leva veneranda Imagem de Nossa Senhora do Castelo, da Igreja Matriz da vila até ao seu Santuário ida percorrendo algumas das artérias da vila que nesse dia se revestem de cor, com as colchas antigas a cair das janelas e varandas, para a passagem da Virgem no Andor.

E no século XIX, XX e XXI?

O marco geodésico que se vê ou “Gurita” ou “Guarita” construída em 1802, ao tempo das invasões francesas, é dos mais antigos de Portugal.

Na região de Aljustrel encontram-se numerosas explorações de óxidos de ferro e manganês representadas por pequenas cortas e galerias abandonadas. A ocorrência deste tipo de explorações e está representada pela existência de hematite (Fe2O3) e pirolusite (MnO2) associadas a níveis de jaspes, chertes, xistos borra-de-vinho e xistos siliciosos da Formação do Paraíso do topo do Complexo Vulcano-Sedimentar formada na era Paleozóica há cerca de 352 a 330 Milhões de anos.

As jazidas foram exploradas essencialmente durante o séc. XIX por pequenas companhias de carácter familiar. Na região de Aljustrel este tipo de atividade levou entre 1869 e 1873 à constituição das seguintes concessões mineiras: Cabeço do Moinho, Herdade de Monte Ruas, Serra dos Feitais, Cerro da Cabeça do Homem, Malpique, Nossa Senhora do Castelo, Moinho Velho, Penedões, Mangancha, Moinho de Vale S. João e Sto. Antão.

Todo o cerro foi afetado pelos trabalhos de mineração de manganês levados a cabo no cerro durante a segunda metade do séc. XIX. Os cerros do Castelo formam uma crista de afloramentos manganesíferos onde foram explorados óxidos e carbonatos. Os óxidos de manganês tiveram grande procura desde meados do séc. XIX por parte da indústria têxtil e os carbonatos de manganês começaram a ser utilizados na indústria do aço desde 1895. Esta exploração mineira continuou intermitente até á década de sessenta do séc. XX.

Num nicho foi colocado uma imagem de Santa Bárbara protetora contra relâmpagos e tempestades, sendo também considerada a padroeira dos bombeiros e dos Mineiros e de todos os que trabalham com o fogo.

Este local está classificado como Imóvel de Interesse Público desde 1992.

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Linha Temporal dos Eventos em Aljustrel:

Idade do Cobre (Calcolítico):

-Primeiros colonizadores se instalam no Morro do Castelo, atraídos pelas massas de sulfuretos polimetálicos.

-Vestígios de ossos de fauna e fragmento de cadinho de fundição de cobre encontrados em escavações.

Idade do Bronze – Idade do Ferro:

-Castro da Mangancha, povoação fortificada, floresce em um cerro próximo.

Período Romano:

-Ausência de registos romanos no Morro do Castelo, possivelmente devido à exploração da mina de Algares.

Século X:

-Fontes árabes mencionam Aljustrel, mas falta de material arqueológico para confirmar a ocupação anterior ao período Almóada.

Período Almóada (Séculos XII – XIII):

-Construção de uma fortaleza no Morro do Castelo, com muralha de taipa, ruas e unidades habitacionais.

-Duas fases identificadas: urbanismo planificado e reforço da muralha como preparação para a conquista cristã.

-Importância estratégica de Aljustrel como centro administrativo e militar, controlando um vasto território.

-Hipótese de a Ermida de Nossa Senhora do Castelo ter sido construída sobre o espaço religioso da época islâmica e o cemitério islâmico na área da atual Igreja Matriz.

1234:

-Conquista de Aljustrel por Paio Peres Correia, Mestre da Ordem de Santiago, marcando um ponto de viragem na Reconquista.

Ordem de Santiago (Séculos XIII – XVI):

-Modificações na fortaleza, incluindo a construção da Torre de Menagem e reparação da muralha.

-Abandono do casario, com o castelo servindo como residência da guarnição militar e administração da Comenda.

-Perda de importância estratégica após a conquista do Algarve.

-Declínio do castelo, descrito como derrubado e sem portas no início do século XVI.

-Colapso final do castelo com o terramoto de 1522.

-Ermida de Nossa Senhora do Castelo em ruínas em 1525.

Século XVII:

Revestimento das paredes interiores da Ermida com azulejos tipo tapeçaria (?)

Século XVIII:

Construção do marco geodésico (“Gurita” ou “Guarita”) em 1802, durante as invasões francesas.

Século XIX:

Exploração de óxidos de ferro e manganês no cerro, com pequenas cortas e galerias.

-Concessões mineiras ativas entre 1869 e 1963 com exploração mineira de manganês no cerro.

Século XX:

-Continuação da exploração mineira de manganês até a década de 1960.

-Construção da escadaria da Ermida nos anos 1940.

-Descoberta de materiais medievais em escavações nos anos 1980.

-Aumento da devoção a Nossa Senhora do Castelo durante a Guerra do Ultramar.

1992: Classificação da Ermida de Nossa Senhora do Castelo como Imóvel de Interesse Público.

Séculos XX e XXI:

-Continuação da atividade mineira em Aljustrel.

-Festividades anuais em honra de Nossa Senhora do Castelo.

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